Teatro

 Peça escrita em 1998

Ora! Viva! Meu senhor!

A peça é dividida em dois atos e procura ressaltar o relacionamento do idoso dentro da sociedade.
A questão do idoso levantada dentro da peça apresenta dois tipos de idosos O rico paparicado pelos parentes, Vó Sebastiana e o pobre abandonado pela família, Tia Agatha.
Também apresenta a convivência de dois casais, João Basto e Adéia que vivem uma relação desgastada e que só esperam a morte de Vó Sebastiana, para receberem a herança e cada um seguir o seu rumo. Também esperando esta herança estão Cesarina e Rui, um casal que vive no interior, mas que vão à capital em busca da fortuna da velha. Cesarina quer fazer do marido o Prefeito da pequena cidade onde mora.

Personagens
Fafa, a empregada.
Adéia, a patroa casada com João Basto.
João Basto, o patrão e amante da empregada.
Tia Agatha/Vó Sebastiana, a velha pobre e maluca e a rica vingativa.
Marylim, uma gata imaginária, no início representada por uma almofada e no final por uma gata verdadeira.
Cesarina, irmã de Adéia e esposa de Rui.
Rui, marido de Cesarina.
Bento Flores, o médico.
Dr. Jacó, o advogado.
Mariana, a amiga de Adéia e de tia Agatha.
Eduardo, o jovem galante.

Cenário
O cenário é formado por uma sala de estar, com poltronas e uma estante com um rádio; uma sala de jantar com mesa e cadeiras; e no fundo do palco uma cozinha com um fogão.

1° Ato
O primeiro ato apresenta os moradores da casa, a chegada de Cesarina e Rui, e a morte de Vó Sebastiana e o sumiço de tia Agatha.

2° Ato
O segundo ato apresenta a revolta da família por não serem herdeiros e a revelação de Tia Agatha sobre a sua verdadeira identidade.

Ato 1

Cena 1: A morte desejada

Tia Agatha está sentada no sofá fazendo tricô. Ela usa um xale escuro e óculos. Som de campainha... Som de campainha... Som de campainha...
Fafa (saindo de uma porta lateral irritada): Já vai, ora bolas!!! (Vê Agatha sentada fazendo tricô e para perto dela) - Ora, tia Agatha, a senhora não está ouvindo a campainha?
Tia Agatha: Não! (volta a tricotar)
Fafa: Não! Mas como a senhora me ouviu?
Tia Agatha: Eu não te ouvi.
Som de campainha...
Fafa (indo até a porta): É hoje, meu Deus... (Atende a porta sorrindo) - Pois não?
Bento Flores (entra na sala segurando uma maleta): Sou o Dr, Bento Flores... Me chamaram!
Fafa (espantada): Chamaram!!! (fecha a porta)
Bento Flores (olhando e andando pela sala e parando em frente de Tia Agatha): Onde está?
Fafa (acompanhando o movimento de Bento Flores): Onde está o quê?
Agatha (pegando a almofada e dando tapas nela): Fica quieta Marylim,
Bento Flores para Fafa: Quem é Marylim?
Fafa: É a gata dela,
Bento Flores: Ah! Uma gata... (colocando o estetoscópio no ouvido e no coração de Tia Agatha, que continua fazendo seu tricô) - É mais grave do que pensei... Deve ser caso de esquizofrenia aguda...
Fafa (espanta-se): Esqui,,, o quê?
Bento Flores (colocando os dedos nos olhos de Tia Agatha e abrindo-os para examiná-los): Esquizofrenia...
Tia Agatha (Com a agulha de tricô na mão espeta o Dr. Bento Flores na bunda)
Bento Flores (pulando pela sala): Ai, sua velha estúpida... Eu vim cuidar de sua saúde e você me dá uma agulhada???
Fafa: O senhor veio fazer o quê?
Agatha (pega a almofada no colo e acaricia): Chora não Marylim, ele não vai fazer nada com você não, Já apliquei uma injeção no fantasma e ele foi embora.
Bento Flores (para Agatha que continua o seu tricô alienada de tudo): Sua velha...
Fafa: Alto lá, oras bolas, quem o senhor pensa que é para entrar nesta casa honrada e xingar a Tia Agatha? Deixa que eu xingo... (para tia Agatha) Sua velha esqui... esquisi... esquisita.
Bento Flores (olhando para Fafa): Então deve ser você?
Fafa: Eu o quê?
Bento Flores (aproximando-se de Fafa e examinando-a com os olhos): A doente.
Fafa (assustada e fugindo do medico): Eu?
Bento Flores: Me telefonaram pedindo que viesse aqui, existe alguém passando mal.
Fafa (aliviada): Ah! Sim... É Vó Sebastiana, ela está muito mal (desanimada fingindo quase chorar) achamos que ela vai...
Bento Flores: Vai pra onde se ela está doente? (senta-se numa poltrona e coloca a maleta no chão) - Alguma viagem nacional ou internacional?
Fafa (vai até outra poltrona, pega uma revista embaixo da mesinha, abre-a e senta-se bem acomodada): Não sei, acho que é nacional. A inter é de Limeira...
Bento Flores: Perguntei se ela vai viajar pelo Brasil, ou, pelo exterior.
Fafa: Acho que interior... O exterior é meio complicado de falar.
Agatha (para a almofada): Marylim quer parar de me dizer que tem alguém que vai morrer lá no quarto... Só vivemos nós duas aqui!
Fafa (surpreende e levanta-se): Ora bolas, é a Vó Sebastiana (fingi tristeza) Está à morte a coitada!!!!
Bento Flores (Levantando-se da poltrona): Coitada! E por que não chamaram o medico?
Fafa (olhando com raiva para o médico): O senhor não é o médico?
Bento Flores (olhando para sua roupa e para a maleta): Ih sou eu mesmo. (rindo-se) - Tem hora que me esqueço... Também comprei meu diploma faz tanto tempo que até me esqueci (sorri) - Mas como está a paciente?
Fafa: Morrendo doutor.
Bento Flores: Coitada!
Fafa: Pois é.
Bento Flores: Onde ela está?
Fafa (saindo na frente do médico que a acompanha): É por aqui.
Agatha para a almofada: Mas que coisa Marylim, deixa eu tricotar em paz...
Entra Adéia pela porta da rua.
Adéia: Que calor! (Vê Agatha) - Olá Tia Agatha. (sentando-se numa poltrona).
Agatha: Bom dia.
Adéia: A senhora e o seu tricô...
Agatha: Só que Marylim não me deixa fazer nada, (pegando a almofada na mão e acariciando-a) - sempre pedindo carinho né fofinha?
Adéia: Como está Vó Sebastiana?
Agatha: Está com o pastor
Adéia (espantada): Pastor, mas ela é católica!
Agatha: Então deve ser o padre.
Adéia (levanta-se e vai saindo rapidamente da sala): Eu vou lá vê-la (esbarra em Fafa que vem voltando) - Olha por onde anda sua afobada!!!
Fafa: Ô mulher canhão e sem educação! (andando pelo palco e falando para a plateia) É pelo jeito vamos ter velório hoje; por isso eu vou limpar a casa, porque se a Vó Sebastiana morrer, a casa enche de gente para chorar e velar a pobre morta, ou seria a rica morta? Acho que tanto faz, o fato é que ninguém dá valor a velha, o que todos querem é que ela morra e seja bem enterrada, porque dai a herança tá segura. (sai da sala)
Agatha (para a almofada): Marylim não chore não... Não é eu não (rindo baixinho)!
Fafa (entra com uma vassoura e vai varrendo o palco): Eta mundão velho, não tem jeito. A velha pode estar ruim, mas eu vou ouvir o rádio (vai até a estante e liga o rádio que toca a música Xibom bom bom e ela canta e dança limpando a casa, trocando Xibom por Kibom sorvete que é bom. A música está no meio, quando João Basto entra na sala vindo do quarto sem que ela perceba)
João Basto (vai até a estante e desliga o rádio): Vó Sebastiana acabou de falecer e você aí cantando e dançando Fafa!
Fafa (surpresa): Como? O quê? Ela pifou mesmo meu senhor?
João Basto: Sim Fafa, ela morreu (vai até uma poltrona, senta-se e chora forcosamente)
Fafa (aproxima-se de João Basto e começa a alisar os seu cabelos): Ora meu senhor, não fique assim, pelo menos a herança ela deixou...
João Basto (sorrindo): Ah! A herança. É claro!
Fafa: E outra meu senhor, com o dinheiro que ela deixou, o senhor pode pagar as dividas, divorciar de dona Adéia e...
João Basto (levantando-se e aproximando-se de Fafa para beijá-la no rosto): E ficar junto com você minha pérola do Tietê! (abraça e a beija)
Agatha (para a almofada): Mas que coisa Marylim, pare de embaraçar a minha linha... Você parece aqueles carrapatos que quando grudam só matando para soltar... Sai de mim... (joga a almofada e ela bate em D João Basto e Fafa)
João Basto (abraçado a Fafa sente que foi atingido, mas pensa ser outra coisa): Mas o que foi isso Fafa? Temos que ficar tristes por Vó Sebastiana (separa-se de Fafa)
Fafa: É tem razão, meu senhor... A velha coitada... (finge chorar e vê a almofada no chão)... Tia Agatha deve ter ouvido que ela morreu, olha onde veio parar a gata. (pega a almofada e joga no sofá ao lado de Agatha).
João Basto (aproxima-se novamente de Fafa e a abraça): Fafa, minha doce... Você tem razão vamos nos casar...
Agatha: Cansei de fazer tricô. (para a almofada) - Não entendo você Marylim, só me enche. Ah! Como seria bom se eu pudesse voltar a ser mais nova, daí eu não iria atrás de você jamais, você fugiu porque quis aquela vez e eu que fui boba indo procurá-la, mesmo sabendo que você é uma gata galinha, eu fui buscá-la e você voltou, mas continuou a mesma fingida de sempre, a mesma vaca! (Dá tapas na almofada e sorri. Levanta-se e começa andar de um lado para outro e não encontra a porta, volta ao sofá, pega a almofada) - Vamos Marylim, vamos dormir (e vai saindo rumo ao quarto, enquanto João Basto e Fafa ficam acariciando-se).
João Basto: Fafa, meu amor!
Fafa: João Basto, meu senhor!
João Basto (soltando-se do abraço de Fafa): Fafa, vamos deixar para depois. (finge chorar) - Coitadinha de Vó Sebastiana...
Fafa: Sim, meu senhor. (também finge chorar e vai saindo com João Basto) - Coitadinha dela!!!

Cena 2: A chegada inesperada

Cesarina abre a porta da rua e entra de mansinho acompanhada por Rui que entra carregado de malas e param na sala.
Cesarina: Olá, alguém em casa? Uhuuu! Hei, sou eu, Cesarina e o Rui. (para Rui que fica com as malas na mão) - Coloque elas aí no chão Rui!
Rui: Sim querida. (Rui coloca as malas no chão).
Cesarina: Ois, alguém para receber a irmãzinha da Adéia???
Rui (sentado-se numa poltrona): Acho que não tem ninguém em casa, querida.
Cesarina: Ora Rui (começa a andar de um lado para o outro, vai até a estante e mexe nos objetos) - Oue sujeira, credo! (Volta até o meio da sala) - Vamos esperar João e Adéia, eles devem ter saído.
Rui: Hum, mas que cheiro horrível tem essa casa fedo de mofo. (tapando o nariz)
Cesarina: Não pense nisso agora, seu lesma, pense que viemos aqui para salvar a nossa situação. Com a morte, graças a Deus (levantando as mãos para cima), de Vó Sebastiana, nós estamos milionários e podemos ter tudo, inclusive a prefeitura do Caracol meu bem. (Fixando os olhos para a porta que dá para os quartos)
Rui: Como é duro ser político neste país! (levanta-se e começa a verificar os objetos do cenário) Onde será que tem um copo? Estou com tanta sede...
Cesarina: Ora Tapado, essa sede pode esperar... Eu pelo contrário tenho sede, mas é de dólares, meu querido (indo até a mesa e pegando na toalha) - Oue mal gosto!
Rui: Se eu pudesse desistia da política.
Cesarina: Nem pensar, você quis ser político, agora vai ser e pare de relinchar, olhe os móveis, o mau gosto, meu doce de abóbora, e deixe eu pensar... (leva o dedo na testa e fica andando de um lado para o outro)
Rui: Sim querida! (Observa os móveis minuciosamente) - São antigos e Pedidos!
Cesarina: Mas dá um bom dinheiro, sabe como é, com pinturas....
Rui: Cesarina, precisamos ficar aqui (olhando para o teto com pavor) - Não podemos ir pra um hotel?
Cesarina: E a economia, onde fica? Pelo menos aqui comemos e bebemos e não pagamos como os presidiários neste país, engordaremos se quiser... Use a sua cabeça seu futuro Prefeito (dando um murro na cabeça de Rui)
Agatha (entra com a almofada na mão): Parece que ouvi vozes.
Cesarina: Tia Agatha!
Agatha: Cesariana minha sobrinha!
Cesarina: É Cesarina tia Agatha.
Rui rindo: É Cesarina e eu sou o Rui o marido dela.
Agatha: Ah, você é o bebê da Cesariana!
Cesarina (para Rui): Cada vez ela está mais doida.... (para Agatha) - Como vai tia?
Agatha: Vou indo sentar no sofá.
Cesarina: O Rui aqui é o meu marido e ele vai ser prefeito nas próximas eleições.
Agatha: Ah, ele faz direito porque ele fazia errado?
Rui: Não minha senhora, ou melhor, Tia Agatha eu vou ser Pre-fei-to de Caracol.
Agatha: Ah! Prefeito, mas ainda existe isso. Ouvi falar que hoje não é mais prefeito que se fala, que agora dizem o defeito social.
Cesarina: Mas Rui é o homem certo, pois ele é perfeito.
Agatha: Deve ser, por ter casado com você... Por saber roubar bem...
Rui (irritado): Mas o que é isso???
Cesarina para Rui: Calma seu palerma (para Agatha) - E Adéia e João?
Tia Agatha (sentando-se numa poltrona e colocando a almofada do lado): Sabe que eu não sei... Acho que eles foram atrás de um mascarado... safado... desavergonhado... atirado... desastrado... ah é comprado...
Rui: Não seria um advogado?
Tia Agatha: É esse mentiroso mesmo.
Cesarina: Pronto! Mal o defunto esfriou debaixo da terra e eles já vão ver o que eles tem. Eta povo fominha, sô!
Rui: Será que eles foram ver o testamento?
Cesarina (esbravejando): Tá na cara sua anta... Ah! Mas eles vão ter que saber que eu também sou herdeira desta velha.
Agatha: Falou comigo Cesariana?
Cesarina (para Agatha): É Cesarina Tia Agatha e não falei com a senhora não.
Rui: Se eles ficarem com toda a herança, adeus prefeitura.
Cesarina: Adeus nada meu querido, você vai ser Prefeito de Caracol.
Rui: Mas como minha rainha, se Adéia e João Basto parecem que querem a herança mais do que nós?
Cesarina: Eles podem até querer, mas nós também temos direito.
Rui: Não sei não.
Cesarina: Nós vamos ter a nossa parte, mesmo que isto nos custe bons advogados e juízes corruptos.
Rui: Acho que para me eleger não vamos precisar de muito não.
Cesarina: Como não seu Jegue, você já viu algum pobre se eleger para Prefeito, o povo que é pobre, odeia pobre, por isso só se elegem aqueles.que tem dinheiro, meu caro... É sempre a elite, a serviço da elite...
Fafa (canta escondida a música Brasil de Cazuza)
Cesarina (para Agatha está alisando a almofada): Quem está ai tia?
Agatha: É a empregada (gritando) - Fafa.
Fafa (entrando assustada): Que foi oras bolas? (vendo Cesarina e Rui) - Oh! Desculpem-me.
Cesarina: Você é a empregada?
Fafa: Sim!
Cesarina: Mas você não tem uniforme?
Fafa: É que mandaram fazer um novo, mais chique...
Cesarina (rindo): Posso ser um pouco curiosa?
Fafa: Pois não.
Cesarina: Quanto você ganha aqui?
Fafa: Ah! Eu ganhava mais ou menos, mas agora eu vou ganhar bem mais (sorrindo) - Sabe como é, serei empregada de madame agora...
Cesarina (para Rui): Vê só, eles já tem certeza da herança... (para Fafa) - Você poderia nos mostrar um quarto, estamos chegando de viagem e estamos exaustos.
Fafa: Mas, quem são vocês?
Cesarina: Eu sou Cesarina a...
Fafa (espantada e aflita): Ah! Sim, mas claro, lógico, oras bolas... Podem vir comigo que eu lhes levarei até o quarto. Os três deixam o palco e saem para a porta que dá para os quartos.)
Agatha (com a almofada na mão, levanta-a e olha fixamente para ela): Ah! Marylim, a casa está ficando cada vez mais cheia e você sabe porque está deste jeito não sabe (rindo e dando tapas) - Para de querer morder e sugar as minhas coisas... Você não tem jeito mesmo. (coloca a almofada no sofá)
Fafa (entrando na sala): Era só que faltava, com essa mulher aqui, meus planos vão por água abaixo.
Agatha: É só você jogar água para cima...
Fafa: Ora, bolas, velha boba... neurótica... O que a senhora entende? (deixa o palco)
Agatha (para a almofada): Você viu Marylim, ela pensa que eu sou boba e neurótica, pois bobos e neuróticos são todos eles que pensam que Sebastiana morreu e não sabem que eu continuo bem viva, não é mesmo Marylim? (tira de dentro da almofada a fotografia de uma gata, levanta-se do sofá e sai lentamente do palco). (A cortina é fechada e rapidamente aberta.)

Cena 3: O jantar e uma visita muito especial

Sentados a mesa estão Adéia, Cesarina João e Rui. Na mesa pratos e uma bandeja de pãezinhos. O jantar já terminou.
Cesarina: E esse advogado vem hoje mesmo João?
João Basto: Sim Cesarina, eu já disse que vem.
Rui: Quanto será que aquela velha deixou em dinheiro, ações e imóveis?
João Basto: Por volta de dois cinco milhões de dólares.
Cesarina: Tudo isto???
Adéia: Até mais do que isso, Vó Sebastiana foi muito viva, nasceu pobre sim, mas teve a sorte de encontrar seis casamentos com homens bem ricos e a maior sorte era ficar viúva e com toda a fortuna dos maridos.
João Basto: Adéia!
Adéia: E não é verdade João? Eu que deveria ser assim, essa velharada com o pé no túmulo fica só atrás de mocinha e o mais interessante é que são cheios da nota.
Cesarina: Enquanto os que não têm, ficam esperando a morte num asilo.
Rui: Bem um negócio é certo, Vó Sebastiana faleceu e nós estamos ricos.
Adéia: Gozado, tia Agatha não ficou nenhum pouco triste, parece que nem ligou para morte da irmã.
Cesarina: É que agora só ela existe, ela nunca gostou de ser gêmea de Vó Sebastiana.
Rui: Mas então João, você já comprou de inicio 3 fazendas de gado?
João Basto: Já, também duas casas e dois carros do ano.
Cesarina: E nós aqui dormindo... Bem minha irmã eu espero que teu marido não tenha usado minha outra metade da herança.
Adéia: Vamos mudar de assunto, deixe eu ver o que Fafa está fazendo. (levanta e sai)
João Basto: Então Rui, você vai ser candidato a prefeito?
Rui: Eu...
Cesarina: Oh! Sim, Rui vai ser um étimo prefeito para a cidade, pelo menos o que eu tenho em plano na cabeça, vai melhorar muito a cidade, como você sabe João, o povo da nossa cidade é muito pobre e com um pouquinho de dinheiro eles vendem tudo, inclusive o voto.
João Basto: Mas Cesarina isto não é legal.
Cesarina: Por que?
João Basto: Estamos vivendo uma outra época agora, há democracia...
Rui: É eu não acho legal, mas...
Cesarina: Eu não sei João, mas hoje em dia democracia é só o lema, muitos compram votos, não pelo poder, porque poder com o dinheiro de Vó Sebastiana, isto nós vamos ter... A nossa performance política é a melhor, só que o povo da cidade não confia só em palavras e para ajudá-los temos que comprá-los, não é mesmo Rui?
Rui: Oh! Sim... é... acho que é.
(Apagam-se as luzes da sala, acende a da cozinha que é acesa por Adéia)
Adéia: Mas que escuro estava isso aqui (grita) Fafa.
Fafa (batendo um bolo numa tigela): Ora minha senhora, a senhora bem sabe que essa cozinha sempre foi escura.
Adéia (indo o forno e abrindo a tampa): E agora com esse dinheiro que vamos receber da herança, nós vamos mudar tudo aqui, inclusive aumentar essa cozinha, reformar a copa, construir duas piscinas bem grandes no terraço com sauna, reformar tudo e principalmente ter uns sete empregados.
Fafa: Sete e eu?
Adéia: Ora, minha querida, você vai ser a nossa governanta, ou melhor, a patroa dos criados.
Fafa: Eu?
Adéia: Sim, você.
Fafa: Ora, minha senhora, eu boba do jeito que eu sou??
Adéia: Mas eficiente minha cara (abraçando-a). O que você está batendo aí?
Fafa: Um bolo.
Adéia: Hum! Pelo cheiro parece que é de maçã.
Fafa: Não é de banana.
Adéia: Hum! Só que para a minha irmã esse bolo deveria ter pimenta, para queimar a língua dela e fazer com que perca esse jeito de madame requintada da elite da 3ª classe e derrube o seu nariz empinado.
Fafa: Além disso, essa dona Cesarina fica me dando ordens, ela que pediu o bolo.
Adéia: Como?
Fafa: Ela que me encheu a cabeça para fazer esse bolo.
Adéia: E por que fez?
Fafa: Ora, minha senhora, ela é sua irmã.
Adéia: Irmã que só me deu trabalho. A patroa sou eu Fafa.. Onde você comprou as coisas para fazer o bolo?
Fafa: No armazém do Zé, e por falar nisso, ele mandou avisar que a conta está atrasada faz três meses.
Adéia: Deixa isso para lá, com esse dinheiro que vamos receber, nós vamos pagar tudo com juros e correção monetária. (vai saindo).
(A luz da cozinha apaga e volta a ser acesa a da sala com Adéia entrando) - Fafa esta fazendo um bolo para logo mais à noite.
Cesarina: Adéia, onde está tia Agatha?
Adéia (sentado-se no seu lugar na mesa): Ela saiu à tarde com Mariana e deve estar jantando com ela.
João Basto: Elas iriam ao cemitério.
Rui: Ao cemitério?
João Basto: Tia Agatha vai sempre ao cemitério depois que Vó Sebastiana morreu.
Cesarina: E o que vocês farão com ela depois de recebermos a nossa herança?
João Basto: Ela vai direto para um asilo.
Rui: Coitada...
Cesarina: Coitada o que Rui??? Bem se vê que você é um coração mole e não é atoa que eu preciso sempre tomar a frente em tudo...
Adéia: Não teremos mais lugar para ela aqui, porque ela está velha e caduca demais e só nos estorva. O lugar de velhos é no asilo e além de tudo o que Vó Sebastiana teve de esperta em sua vida ela teve de burra. Casou apenas uma vez e com um pobretão, conclusão, morrerá pobre e sozinha. Quem mandou ela ser boba.
Cesarina (comendo um pedaço de pão): Eu concordo, velho quando tem dinheiro dá até para aturar, mas se é pobre, o asilo é o lugar certo. Os velhos pobres são como um móvel velho que só nos trazem cupins e além de atrapalhar a nossa vida, só dão gasto. Deus me livre de ficar velha.
João Basto: Até que eu tenho pena dela.
Adéia: Mas o que podemos fazer, ela escolheu assim, tivesse casado, tivesse filhos, e acima de tudo tivesse tido a ousadia de ficar rica.
João Basto: Ela está meio surda e além de tudo neurótica, não serve para nada.
Cesarina (para Adéia): Por que vocês não arranjam uma pessoa para cuidar dela Adéia?
Adéia: Não, isto custa dinheiro e quanto mais podemos deixar de gastar com ela Cesarina, mas podemos investir... Por que você não arruma alguém?
Rui: É acho que...
Cesarina (para Rui): Você não acha nada Esqueceu querido, ameba não pensa!... (para Adéia) - Não minha irmã, assim como você nós também vamos fazer investimentos.
João Basto: A Mariana é a única que gosta dela.
Cesarina: Essa Mariana, João, não poderia ficar com ela?
Adéia: Coitada da Mariana, não tem onde cair morta, é pobre a coitada... Cesarina asilo existe para isso, para os velhos morrerem em paz.
Rui (levantando-se enfurecido): Basta! Basta! Eta familinha egoísta. (sai do palco tomando o rumo dos quartos)
Cesarina (surpresa): O que deu nele? (levanta-se e sai atrás dele gritando) - Rui volte aqui, ainda não comemos a sobremesa e é falta de educação.
João Basto: É Adéia com essa sua irmã aqui, meus planos foram por água abaixo.
Adéia: É, nós iríamos ficar com tudo, mas eles... e vai ser difícil dividir... Sinto cócegas de dinheiro na minha mão.
João Basto: Eu também. Vai ser difícil o divórcio...
Adéia: Oh! João não toque nesse assunto. Eu sei que não dá mais, mas sei que você me ama.
João Basto: Não é bem assim, Adéia.
Adéia: Existe outra não é mesmo?
João Basto: Outra?
Adéia: Sim, existe outra né? . (pegando a faca em cima da mesa e furiosa) - Mas se eu descobrir eu mato você ouviu.
João Basto: Não vai matar ninguém porque não existe ninguém.
Adéia (colocando a faca na mesa e alisando o braço de João): João, nós estamos ficando velhos e sem nenhum filho, o que será de nossa velhice, solidão no fim da vida.
João Basto: Com dinheiro, nunca ficaremos sozinhos. Veja o caso de Vó Sebastiana, nós a trouxemos para morar conosco e só cuidamos dela esse tempo todo porque ela era rica. Tá certo que junto veio tia Agatha, mas tudo na vida tem seus espinhos...
Adéia: Não gostaria de separar-me de você.
Fafa (entra com uma travessa na mão trazendo o bolo, João e Adéia estão chateados): O bolo, minha senhora.
Adéia: Acho que ninguém vai comer o seu bolo, Fafa.
Fafa (colocando a travessa na mesa): Chiii, mas que caras...
João Basto: Deixa esse bolo aí Fafa, que eu vou comer.
(Som de campainha)
Fafa: Eta vida. Eu não tenho sossego. (vai até a porta e abre-a) - Pois não?
Jacó (entrando na sala): Boa noite seu João Basto está aí?
João (levantando-se da mesa e indo até o Dr. Jacó): Que houve Dr. Jacó. (chega até ele e aperta-lhe a mão. Adéia vem atrás de João) - Mas vamos entre.
(Dr. Jacó, João e Adéia vão para o meio da sala e sentam-se nas poltronas, Fafa fecha a porta e deixa o palco)
Jacó: Tudo bem com vocês, João?
João: Sim Dr. Jacó, o senhor já conhece minha esposa Adéia?
Jacó: Muito prazer senhora A...
Adéia: Adéia... (sorrindo) Adéia doutor, como vai?
Jacó: Vou indo senhora Adéia, com uma dor na perna que nem te conto, tenho reumatismo sabia? (para João) - Mas vejo que é muito bonita a sua esposa João.
João Basto: Ora Dr. Jacó... O senhor veio para falar sobre o testamento e não sobre a beleza de minha mulher, não é mesmo?
Adéia: Que é isso João? Isto são jeitos de tratar o doutor.
Jacó: Pois é, hoje é o grande dia.
João Basto: O senhor trouxe o testamento?
Jacó: Sim e eu vou precisar de toda a família aqui.
João: Isto não será problema, minha cunhada está aí... (levanta-se) - Eu vou chamá-la. (deixa o palco)
Jacó: Acho que enganamos bem Adéia.
Adéia (sorrindo insinuante): Ora, Jacó, você não devia me fazer elogios de graça perto de João.
Jacó: Você sempre com essa cara de santinha... Ah se ele soubesse a mulher que você é... Você realmente está linda sabia?
Adéia: Eu quero ver a cara do João e da Cesarina, a hora que souberem que eu sou a única herdeira.
Jacó (preocupado): Adéia, eu preciso te falar uma coisa, os nossos planos...
João Basto (entra acompanhado de Cesarina e Rui com a cara toda machucada): Aqui está Dr Jacó, minha cunhada e seu marido.
Jacó (levantando-se e cumprimentando Cesarina e Rui com aperto de mão e para Rui): O que foi isto ao rosto?
Rui: Hã... (mal podendo falar)
Cesarina: Ele caiu de cara no chão. (Jacó, Cesarina, João e Rui sentam-se nas poltronas.)
- Ah! doutor não sabia como esperávamos a sua vinda.
Jacó: É eu também não via a hora de vir até aqui e Ihes passar o conteúdo deste testamento... Como sabem, eu sou só o porta-voz do tabelião... Este não podia vir e eu o substituirei na leitura do testamento.
Cesarina (entusiasmada): Que venham os dólares... Muitos dólares!
Adéia: Muito mais do que você sonha irmãzinha, não é mesmo Jacó?
Jacó: Eu... Eu não sei...
Neste momento a porta é aberta e Mariana entra desesperada: Adéia do Céu, tia Agatha sumiu!
Adéia: Sumiu? Ora, Mariana também não vamos precisar dela, agora vai ser lido o testamento de Vó Sebastiana e é até bom que ela não esteja presente. Senta aí!
Jacó: Ah! Eu acho bom não falar assim Adéia, sem ela aqui o testamento não pode ser lido, pois para ele ser lido tem que estar todos os membros da família, inclusive ela.
Cesarina (para Jacó): Ah! Essa não. Vó Sebastiana deixou alguma coisa para tia Agatha?
Jacó: Não sei, na verdade eu não sei quem é herdeiro aqui.
João Basto: Como não sabe, o senhor não ajudou a redigir o testamento?
Jacó: Era para ser eu, mas Dona Sebastiana antes de morrer, pediu para outro, o Sérgio, e eu apenas vim para fazer a leitura, mas sei que toda família tem que estar presente.
Rui: Quer dizer que se tia Agatha não vier logo, nós não poderemos saber o que tem no testamento?
Jacó: Sim, se ela sumiu, vocês terão que encontrá-la, só depois o testamento poderá ser lido.
Adéia: Ora, isso é demais.
Mariana (para Adéia): Adéia, nós estávamos no cemitério e ela sumiu e eu não sei para onde ela foi.
Adéia: Era só o que faltava agora, essa velha nunca serviu para nada e agora ela some... Mas também por que Vó Sebastiana tinha de colocá-la no testamento? Se ela tiver algum dinheiro para receber, ela nem vai querer... Ela é uma demente.
Rui: Que é isso Adéia, você tem que lembrar que tia Agatha era irmã de Vó Sebastiana e é justo ela ter sido lembrada no testamento da irmã,
João Basto: Rui, eu acho que você está certo.
Cesarina: Está certo nada, João. Adéia tem razão, o que essa velha com o pé na cova fará com alguns míseros dólares, mas que nos ajudará bastante, Ela é neurótica e está alheia no mundo, O melhor para ela é mesmo o asilo.
Jacó: Acho que devemos procurar Dona Agatha, para podermos ler o testamento ainda hoje.
Mariana: Eu já procurei por toda a parte e nada.
Cesarina: Vamos anunciar na TV, é mais rápido, Adéia você deve ter uma fotografia dela, não?
Adéia: Tenho sim.
João Basto: Então o que você está esperando, vá pegá-la!
Cesarina: Eu vou com você Adéia.
Adéia (levanta-se da poltrona e Cesarina também): Está no quarto dela. (As duas deixam o palco,)
Jacó: É nós teremos que esperar até que ela chegue para sabermos o que é de quem.
João (decepcionado): E eu que não via a hora de meter a mão nessa grana.
Rui (preocupado): Mas eu estou achando tudo isso muito sério... E se tia Agatha estiver morta?
Mariana: Que é isso? Vire essa boca para lá...
Rui: É uma hipótese, mas pode ter sido o que aconteceu também.
Jacó: Se ela estiver morta sé poderei ler o testamento com apresentação do atestado de óbito.
João Basto: Mas ela não está morta, ela apenas sumiu.
(Adéia e Cesarina voltam ao palco com a foto)
Adéia: Aqui está uma foto dela,
João Basto: Acho melhor irmos a emissora logo.
Cesarina: A rede Globo não é aqui perto?
Mariana: É, só que um anúncio nela é muito caro,
Cesarina: E quem perguntou o preço, com a grana que vamos ter, a globo será fichinha perto de nós.
João (levantando-se acompanhado por Rui): Vamos então!
Adéia: Só que cada um dá um pouco para pagar o anúncio.
Jacó: Vocês estão mais preocupados com o dinheiro do que com a velha.
Mariana: É. Eu também acho.
Cesarina: Vamos, se anunciarmos logo, mais rápido ela estará aqui e (esfregando as mãos) poderemos saber de quanto é a nossa fortuna.
(Adéia, Cesarina, João e Rui vão saindo, quando João nota Mariana e Jacó sentados na poltrona)
João Basto: Vocês não vem?
Jacó: Não João, prefiro esperar.
Mariana: Se ela aparecer aqui, pelo menos eu estarei para recebê-la.
João Basto: Seja como quiser.
(Os quatros deixam o palco)
Mariana (eufórica): Tudo do jeito que foi combinado, Jacózinho...
Jacó: É Marianinha, quem tudo quer nada tem...
Fafa (entrando): Oras, bolas, onde está todo mundo?
Mariana: Saíram, foram fazer um anúncio para ver se conseguem descobrir onde foi parar a dona Agatha.
Fafa: Uai, por quê?
Jacó: Porque ela sumiu...
Fafa (assustada): Meu Deus, a velha sumiu... (finge chorar) - Coitadinha da dona Agatha.
Jacó: Fique tranquila mocinha, ela vai aparecer.
Mariana: É Fafa, logo ela estará em casa novamente.
Fafa (chorando aos soluços vai deixando o palco): Coitadinha da véia... Coitadinha...
Jacó (observando Fafa deixar o palco e a hora que ela sai, ele volta-se para Mariana): Lágrimas de crocodilo... Coitada é desta besta que tá chorando.
Mariana: Fale mais baixo Jacó... E Adéia?
Jacó: Sei lá... Eu fiz como o combinado, mas acho que me apaixonei por ela, sei lá.
Mariana: Seu traidor!!!
Jacó (com cinismo): Calma, a gente vai se entender Mariana, eu vou acabar com ela, juro.
Mariana: Sei, (A cortina é fechada e rapidamente aberta)

Cena 4: O  dia D

Fafa (varrendo a sala de jantar): Ô casa pra dá trabalho, que sujeira está isso aqui, Faz três dias que tia Agatha sumiu e a casa está mais suja de quando ela estava aqui.
João Basto (entra meio sonolento): Olá Fafa.
Fafa: Olá meu senhor, dormiu bem?
João Basto: Como se pudesse dormir com esse maldito sumiço de tia Agatha,,, (senta-se na mesa) - Nenhuma noticia dela?
Fafa: Não, meu senhor, mas ela aparecerá, está falando direto nas rádios e até no programa da Ana Maria Brega foi anunciado... (olhando com carinho para João) - Oh! Meu senhor, estás tão abatido, essas noites sem dormir.,,
João Basto: É a situação minha cara.
Fafa (aproximando-se de João e passando a mão em seus cabelos): E se ela não aparecer meu senhor?
João Basto: Adeus herança.
Fafa: Adeus herança?
João Basto (pegando a mão de Fafa e beijando-a): É Fafa, meu limãozinho cravo... e adeus também a nós.
Fafa: A nós! Meu Deus, então é pior do que eu pensava, mas também o que essa velhota tinha de sair justo naquele dia...
João Basto: É ninguém pensou que...
Fafa: Pobre senhor... Está tão feio com essas olheiras... Meu senhor, fique tranquilo ela ira aparecer e o senhor irá receber o seu dinheiro.
João Basto: Deus te ouça, minha cara Fafa. (levanta-se e vai saindo) - Eu vou para o meu quarto, qualquer coisa me chama. (deixa o palco)
Fafa (para a plateia): Coitado do meu senhor, coitadinha de mim, se essa velha não aparecer eu vou ser empregada pro resto da vida... (deixa o palco)
A porta de entrada do palco é aberta devagar e Agatha aparece.
Agatha (entra e fala com a almofada que está na mão): Psiu! (fazendo sinal com a mão) - Quieta Marylim! Não devemos fazer muito barulho, senão eles descobrem que voltamos (olha para o chão do cenário) - Nossa que sujeira! Também isso aqui deve estar uma zona, Fafa namorando as escondidas com João, Adéia se arrumando toda para encontrar Jacó, Cesarina dando ordens ao Rui e será que Mariana está por aí? Coitada... O que você acha de irmos vê-la? (vai saindo quando é surpreendida por Rui que vai entrando pela porta dos fundos)
Rui: Tia Agatha!!!
Agatha (dando um pulo para trás de susto): Oh! Rui.
Rui: Para onde foi?... Estávamos preocupados?
Agatha: Marylim fugiu e eu fui a sua procura. E acredite você Rui, que ela foi para um zoológico.
Rui: Tia Agatha, estou feliz em vê-la. (Agatha volta até a sua poltrona e senta-se acompanhada por Rui)
Agatha: É.
Rui: Sabe eu se pudesse a levaria para morar comigo.
Agatha: Ah! Eu sei que você é muito bonito.
Rui (sorrindo): Não tia Agatha, eu estou falando (gritando) morar comigo.
Agatha: Eu morar com você e Cesariana... Eu fico louca...
João (entra e fica surpreso): Tia Agatha!
Agatha: Oi, João.
João Basto: Por onde a senhora andou?
Agatha: Atrás de Marylim, ela fugiu, mas eu consegui pegá-la de novo.
Rui (para Agatha): E ela está bem?
Agatha: Oh! Sim, ela estava de paquera com um gato rajado.
João (para Rui): Rui, vamos chamar o Dr. Jacó.
Rui (levantando-se): Sim João. (Rui e João saem do palco)
Agatha: Agatha (levanta-se e vai saindo do palco em direção aos quartos) (para a almofada) - É Marylim, agora vai ser a hora.

Cena 5: A leitura do testamento

A sala está vazia e ouve-se o som da campainha.
Fafa (entrando apressada): Droga, já vai (abre a porta)
Jacó (indo até o meio da sala): Olá Fafa.
Fafa: Oh! Doutor.
Jacó: Onde está todo mundo?
Fafa: Estão lá no terraço.
Jacó: E a tia Agatha?
Fafa: Está no seu quarto, eu vou chamá-los. (fecha a porta e deixa o palco, enquanto Jacó fica em pé no palco)
Jacó: Até que enfim, agora saberão o que dizem estes papéis.
Agatha (entra sem a almofada): Olá, doutor Jacó.
Jaco (rindo): Tia Agatha, a senhora conseguiu nos dar um susto bem grande.
Agatha: Foi Marylim... (rindo)
Jacó (aproxima-se da mesa e puxa uma cadeira, mais distante da mesa): Sente-se aqui!
Agatha (sentando-se na mesa): Obrigada, Jacó.
Cesarina (entrando ansiosa): Nem acredito que hoje vamos saber o que temos.
Jacó: É o susto passou e agora é a festa.
Chegam Adéia, João Basto e Rui)
João Basto: Pronto doutor, hoje não falta ninguém.
Jacó: Sentem-se todos.
(todos sentam em volta da mesa)
Adéia: Já sinto cócegas na mão.
Jacó (sentando-se e abrindo a sua pasta de onde tira o testamento) (para Adéia): Adéia poderia nos pedir um cafezinho?
Adéia: Mas é lógico. (gritando) - Fafa.
Fafa (entra assustada): Pronto, senhora.
Adéia: Traga-nos um café!
Fafa: Um café?
Adéia: É, um para cada um de nós.
João Basto: E uns biscoitos.
Fafa: Sim senhor... (deixa o palco)
Jacó: Então eu vou começar a ler o tão esperado testamento.
Agatha: Eu quero falar uma coisa antes.
Adéia: O que é tia Agatha?
Agatha: É que eu e Marylim, ou melhor Marylim e eu, decidimos mudar daqui. Nós só damos trabalho para vocês, então achamos melhor ir para um asilo no começo, mas agora nós resolvemos que vamos nos casar novamente.
Todos surpresos (menos Jacó): Casar??!!
Agatha: É Marylim com o gato rajado dela e eu com o gato dono dele. Nós vamos embora depois desta convenção.
Cesarina: Pirou de vez...
Adéia: É, deve ser isso.
João Basto: Bem, se a senhora vai nos deixar de um modo ou de outro, isto demonstra consciência, pelo menos uma vez na vida.
Cesarina: Tia Agatha, seja onde for que a senhora irá, será melhor para todos, né?
Rui: Espero que a senhora seja feliz com o marido.
Agatha: Eu vou ser. Ele é só sessenta anos mais novo do que eu, tem 20, o gatinho.
Todos surpresos (menos Jacó): 20 anos?!
Adéia (para os outros sentados na mesa): É cada vez me convenço mais que ela está,louca.
Jacó: Bem, eu vou começar a ler o testamento de dona Sebastiana Maria Silveira da Cruz Ferreira Aventura da Silva, conhecida como Vó Sebastiana (entra Fafa com o café e os biscoitos, coloca-os sobre a mesa e fica em pé perto da mesa) - Ele começa assim São Paulo, dia 22 de abriI de 2012. Queridos netos e irmã.
(Som de campainha)
Fafa: Droga! (vai até a porta e abre-a)
Mariana: Olá, Fafa. (entrando no palco) - Já começou a leitura?
Adéia: Oh! Mariana entre e junte-se a nós. O Dr. Jacó está no início. (Mariana aproxima-se da mesa e senta numa cadeira)
Jacó: Eu posso continuar agora?
João Basto: Claro.
Adéia: Eu estou tão ansiosa.
Cesarina (roendo as unhas): E eu, então?
Jacó: Queridos netos e irmã, eu, hoje gozando da vida com Deus e com todos os meus maridos, dos quais herdei o privilégio de ser rica, quero passar a vocês algumas verdades sobre a minha herança. Tenho 7 fazendas no Mato Grosso, avaliada em 7 milhões de dólares, ações valorizadas da Petrobrás que chegas a 3 milhões, mais 10 apartamentos no Leblom, no Rio de Janeiro e no Alphaville em São Paulo, 30 casas de aluguéis, tudo chegando a um total de 50 milhões de dólares e também uma dívida de 15 milhões de dólares que herdei do último casamento, o único com amor.
João Basto: O quê?
Cesarina: Divida de 15 milhões de dólares. Por isso que ela morreu. Morreu de arrependimento de casar com um pobretão.
Jacó: Ele não era pobre, era um jogador viciado.
Adéia: Mas ainda dá para pagar e ainda sobra 35 milhões.
Rui: É você tá certa.
Jacó: Por favor, depois vocês conversam, deixa eu ler o testamento... "sei que depois disso vocês vão entrar numa discussão, mas quero que saibam que essa divida já foi saldada. Bem para Adéia, minha neta e João seu marido que continuam casados só para conseguirem a herança eu deixo...
Cesarina (para Adéia): O que ela quis dizer com isso?
Adéia (chateada): Não sei
João Basto (irritado): Fique quieta, Cesarina.
Jacó: Continuando... para Adéia (olhando para ela), você precisa criar vergonha na cara e parar de ter seus casos com os coroas que entram pela porta da sala e acabam indo para a sua cama de casada... (Adéia abaixa a cabeça e João demonstra raiva), você tem marido sabia?
João Basto (irritado): Mas, o que é isso?
Jacó: É o testamento João.
João Basto (pega Adéia pelo colarinho da blusa): Adéia, o que você tem a dizer sobre isso?
Rui (gritando): Calma, João!
Cesarina (rindo): Minha irmã, quem diria hein, cheia de amantes ..
Rui (bravo): Cesarina!
Cesarina: O que foi seu bolha, não é verdade Adéia?
Adéia (chorando): Não! Não é verdade.
Jacó: Por favor deixe eu continuar...
João Basto: Tudo bem Dr. Jacó, continue.
Jacó: Para João Basto, o marido de Adéia minha neta e meu neto, eu deixo... João você deveria parar de namorar a Fafa pela casa, enganando a coitada da empregada. Você é casado e sua mulher como você deviam ter mais vergonha na cara. São dois libertinos...
Adéia (revoltada): João, você a Fafa... Amantes???
Fafa: Ah! Meu Deus... Meu senhor, essa velha sabia de tudo! (sai correndo deixando o palco).
João (aflito para Adéia): Eu e Fafa temos um caso sim, como você também tem os seus.
Cesarina (ironizando): Mas, que casal, meu Deus!
Jacó: Por favor deixem-me continuar, quanto a Cesarina eu deixo minhas bijuterias velhas e peço que ela pare de mandar no seu marido e ser tão autoritária. Ele é um ser humano, sua bruaca e quer ser feliz. Você é quem deve entrar para a política, pois lá é o lugar de gente falsa como você. E para o Rui eu gostaria de pedir que dê uma de macho e cante de galo em sua casa, use, se preciso for, uma cinta de couro, e dê uma coça nesta minha neta metida a besta. Seja homem, meu neto!!!
Cesarina (enfurecida): Aquela bruxa!
Rui: Cale a boca Cesarina (falando no ouvido dela) – Bruaca!
Jacó: E para minha querida irmã Agatha, eu deixo toda a herança até quando meus netos criarem vergonha na cara e serem pessoas de verdade, humildes e fiéis, ai ela poderá, se quiser, distribuir a herança. Mas, para isso Adéia e João precisam parar com os namoricos e ter um filho. Cesarina e Rui serem um casal de verdade e democrático e também ter um filho, dai poderão ter a minha herança, se Agatha, a minha irmã quiser.
Adéia: Ora, quem ela pensa que é?
João Basto: Eu não quero ficar com você Adéia, nem para ficar rico.
Adéia: Nem eu com você João Basto
Cesarina: Calma minha irmã. É simples, é só você ter um filho.
Adéia: Com quem, com esse impotente?
João Basto: Impotente é a mãe.
Adéia: Esqueci tapado. Coitada de Fafa (rindo) no terceiro mês de vocês juntos, ela vai pedir demissão de amante... Você não serve para nada.
João (levantando-se e indo pra cima de Adéia): E você sua vadia, que fica atrás dos velhotes. Deve ser para eles poderem rir. Você é uma piada.
Cesarina: Eu é que não vou ter um filho do Rui.... Pamonha já chega um.
Rui: E eu com isso, o fato é que prefeitura nunca mais.
Cesarina: Nunca mais, uma vírgula, custe o que custar você será o prefeito de Caracol.
Agatha: Bem, acho que já acabou, (para Jacó) - Não é moço?
Jacó: Sim, só falta a parte da senhora. A metade do que tem já foi distribuído aos asilos, como a senhora pediu a Dona Sebastiana para fazer.
Adéia: Tia Agatha!
João Basto: Como?
Agatha: Bom, eu vou arrumar a mala e vou casar, vou morar com meus gatos...
Rui: Por que a senhora fez isso?
Cesarina: Porque é uma besta.
Tia Agatha (saindo): Porque eu conheço as serpentes que vocês são, só isso. (Grita) - Marylim. (Um som de gato miando é ouvido por todos )
Cesarina: O que é isso?
Mariana (rindo): É a Marylim. (levanta-se e sai do palco)
Adéia: Acabou né, Dr. Jacó?
Jacó: Acabou-se o que pensavam que era doce.
João Basto (cabisbaixo): Estamos arruinados!
Cesarina (triste): Estamos falidos! (A cortina vai fechando lentamente)

Ato 2

Cena 1: A revelação

Som de campainha.
Fafa (gritando escondida no palco): Já vai.
(Entra no palco com a roupa rasgada, desconsolada e suja e vai até a porta. Abre-a e entra Bento Flores.)
Bento Flores: Bom dia Fafa.
Fafa: Maus dias o doutor quer dizer, né?
Bento Flores: Maus dias Fafa, por quê? (vai entrando e se posicionando no meio do palco)
Fafa (fechando a porta e acompanhando o médico): Oras, bolas, doutor Bento Flores, por quê? Olhe para mim, vê como estou.
Bento Flores (tirando uma lupa do bolso e fixando-a no rosto de Fafa): Doente parece que você não está.
Fafa: Estou pobrezinha de marre, marre, deci.
Bento Flores (voltando-se para o meio da sala e sentando-se numa poltrona): E o que tem isso? Você sempre foi pobre.
Fafa: Oras, bolas, doutor Flores (balança a cabeça negativamente e olha para o médico) - Esquece!
Bento Flores: Quem está passando mal?
Fafa: Todo mundo, inclusive eu.
Bento Flores: Mas o que vocês sentem?
Fafa: É a fome, doutor... É a fome...
Bento Flores: Para de piadas Fafa.
Fafa: É verdade doutor.
Bento Flores: E o sr. João?
Fafa: O meu senhor (chora) está no terraço tentando apanhar alguns insetos para o almoço.
Bento Flores: Insetos?
Fafa: É, nós não temos o que comer... Ontem fizemos uma sopa de baratas(chorando) - O senhor sabia que com o número de baratas neste pais daria para matar a fome de muita gente.
Bento Flores (fazendo uma cara de repugnância): Baratas! Que nojo!
Fafa: Outro dia mesmo comemos tutu de lesmas com folhas de comigo ninguém pode (Grita desesperada) - Ah! Doutor como sofremos!
Bento Flores (tirando um chiclete do bolso e levando a boca): E a dona Adéia?
Fafa: Ela está na rua tentando ver se consegue que alguém lhe venda algum alimento fiado.
Bento Flores: Mas o que houve com essa família? Endoidaram, foi? (rindo) - Bem de médico, poeta e louco, todo mundo tem um pouco, não é mesmo?
Fafa: A família Bastos, faliu. (para o público) - Governos dos Itamares, Ferrandos, Lulabriares e das Dirmals.
Bento Flores: Que triste e a velha Agatha?
Fafa: Aquela não mora mais aqui não, está vivendo com os gatos... O da Marylim e o dela.
Bento Flores: Gatos???
Fafa: É a Marylim casou e ela também.
Bento Flores: Felicidades para elas então.
Fafa: Felizes eu acho que devem estar, enquanto nós (Grita) - Coitados de nós!
Bento Flores: Coitados de vocês...
Fafa: Dona Cesarina não voltou para Caracol não, sabe como é, cidade pequena, povinho metido a rico. Imagine ela lá vivendo de favor... Ela está no tanque lavando roupas e seu Rui Ihe dando ordens.
Bento Flores: Então pelo que vejo ninguém está doente, todo mundo desta casa está muito bem.
Fafa: Mas dona Cesarina está muito resfriada, doutor Bento.
Bento Flores: Mas ela não está lavando roupas?
Fafa (com olhar sádico): Esfregando roupa na mão (rindo e dando soco na mão para o público) - Bem feito para aquela megera. (volta-se para o médico) - Venha comigo doutor, eu vou levá-lo até onde ela está.
Bento Flores (levanta-se da poltrona e sai do palco com Fafa).
(A porta da rua se abre e entra Adéia com os cabelos despenteados, roupa rasgada, parecendo uma louca)
Adéia (entra, fecha a porta e para no meio do palco): Ufa! Como é duro ser mendiga (vai até uma poltrona e senta-se) - É daqui a pouco nem estofados teremos mais para sentar... Que inferno que está minha vida até Jacó me trocou por aquela tonta da Mariana.
João Bastps (entra com a roupa também toda rasgada): Ora, Adéia, já em casa?
Adéia: Sim e muito cansada.
João Basto: Conseguiu alguma grana?
Adéia: Com o quê? Se pelo menos tivesse roupa melhor do que essa?
João: Ora, para pedir esmolas tem que ser uma roupa assim Você já viu uma pessoa bem vestida conseguir algum nick?
Adéia: Ah! João que gracinha... Se eu pudesse, eu acabava com você.
João (sentando-se em outra poltrona, cínico): E como querida?
Adéia (furiosa): Querida é a mãe, seu desgraçado!
João (rindo): Ah! Isso eu sou mesmo querida. (A porta da rua é aberta e entra Agatha, mais jovem, grávida, com roupas finas, com uma bolsa na mão que fica girando e uma gata de verdade nos braços, acompanhada de um jovem)
Agatha: Olá sobrinhos.
Adéia e João (espantados): Tia Agatha!!!
Agatha: O que há com vocês, parecem que nunca me viram, quer dizer, quando eu vivia aqui talvez nunca me tivessem visto mesmo, como uma pessoa (anda pelo palco), mas eu estou aqui, bela, faceira (aproxima-se do jovem), apaixonada e grávida deste gato. (dá-lhe a mão e ele a beija). Eduardo, meu anjo, esses são seus sobrinhos.
Eduardo: Como vão?
João Basto para Adéia: Eu não acredito nisto?
Adéia: Tia Agatha, a senhora está grávida aos 80 anos?
Agatha: Sim Adéia, vou ser mãe... Sabe como é, a ciência hoje está muito adiantada... Não vê o milagre que fez em mim. Voltei a ter 30 anos.
João Basto (rindo): É realmente a senhora está muito bonita.
Eduardo: Bonita? Ela está linda (aproximando-se e beijando Agatha no rosto)
Agatha (para Eduardo): Aquela Mercedes que você pediu baby, você acaba de ganhar.
Adéia: O que a senhora está dizendo?
Agatha: Quando o nenê aqui fala algo que gosto de ouvir eu Ihe dou um presentinho. Ontem foi um apartamento de cobertura na avenida Atlântica.
João Basto (levanta-se da poltrona): Eu não acredito nisto. Nós aqui matando cachorro a grito e a senhora distribuindo presentinhos...
Adéia (levanta-se também): É verdade.
Agatha (alisando a gata): E porque o espanto? Veja Marylim, vocês nunca a viram, no entanto ela sempre esteve aqui. Vocês nunca me viram e, no entanto, eu sempre estive aqui. Tanto ela como eu, encontramos o amor, enfim, nós voltamos para a vida e pelo que vejo vocês que queriam mesmo a tão sonhada vida, hoje encontraram o seu lugar.
João Basto: A senhora veio aqui para nos humilhar, foi?
Agatha: Não Vim para lhes contar a verdade, fiquei sabendo que já sofreram bastante.
Adéia: Verdade? Mas que verdade?
Agatha: Eu na verdade não sou e nunca fui a Tia Agatha. Eu sou a Vó Sebastiana e quem morreu no meu lugar, foi a Agatha, minha querida irmã.
Adéia (espantada): O que a senhora está dizendo???
João Basto: A senhora só pode estar louca.
Eduardo: Não chame meu docinho de coco de louca! (para Agatha) - Não é benzinho?
Agatha(vai até a sua poltrona e senta-se, coloca a gata do lado): Pode parecer loucura, mas não é. Agatha estava passando muito mal e eu naquela época estava com uma gripe muito forte e me encontrava de cama. Agatha me contava que não tinha tratamento, o melhor, ninguém ligava para ela, tanto é que eu combinei com o Dr. Jacó que eu ficando boa, ela iria para o meu leito e assumiria a minha identidade.
Adéia (caindo sentada na poltrona): Mas por que isso?
João Basto: Agora entendo porque o médico que cuidava da senhora, não apareceu mais aqui e o Jacó fez questão de que o idiota do Bento Flores cuidasse da senhora, ou seja, da tia Agatha. Eduardo (senta-se do lado de Agatha e pega a gata no colo fazendo carinhos nela)
Adéia: Mas por que a senhora fez isso?
Agatha: Se eu fosse a Agatha, vocês me notariam, saberiam que eu existia? Vocês sempre a trataram com desdém só porque a coitada era pobre. Ela ficava jogada num canto fazendo parte da mobília velha da casa, um móvel velho sem serventia para vocês, mas que fazia jogos de crochê como ninguém e isso vocês sabiam, pois usavam as blusas que ela fazia. De outro lado, eu era paparicada por causa do meu dinheiro, tudo em nome do interesse de conseguirem a minha herança.
Cesarina (entra vestida com um avental, toda suja e vê Agatha): Tia Agatha!
Adéia: Tia Agatha não Cesarina, Vó Sebastiana (sai chorando do palco)
Cesarina para João: O que deu nela? (sai atrás de Adéia) - Adéia o que houve?
João Basto: A senhora pretendia o que com a farsa?
Tia Agatha: Eu queria ver com meus próprios olhos se era verdade que os que me paparicavam, faziam da minha amada irmã, (olha para o teto do palco) que Deus a tenha, uma pobre coitada, abandonada dentro da sua própria casa.
João Basto: Mas a senhora tem que entender quê...
Agatha: Entender o quê?
João Basto: Ora, nós somos humanos e o ser humano é ambicioso e na sua ambição não cabe uma velha pobre. (começa a andar de um lado para o outro)
Agatha: Eu também sou humana, Agatha também era humana. Marylim é humana.
João Basto: Opa, alto lá, Marylim é um animal.
Agatha: É uma gata carinhosa e fiel, muito mais humana do que muitos que se julgam ser. Não é atoa que temos tantos veterinários.
João Basto (furioso): Seja como quiser, mas e agora, vai nos destruir de uma vez?
Agatha: Não, muito pelo contrário. (para Eduardo) - Dê a eles os recibos de depósitos!
Eduardo (pega os recibos de depósitos no bolso da camisa e entrega a João)
João Basto: Quatro recibos de depósitos no valor de 2 milhões cada, um na conta de Adéia, outro na conta de Cesarina, um na minha e outro na do Rui.
Agatha: Vocês são meus netos, Adéia e Cesarina são filhas de meu filho que morreu, e portanto, dou a vocês em vida, apenas 40% do dinheiro que possuo, os outros 60% e imóveis, fazendas ficarão sobre a minha guarda até que eu morra, se isso for possível, já que mandei fazer um clone meu.
João Basto (feliz): Ora, mas isto é ótimo. Mas e o testamento?
Agatha: Foi tudo tramado com o Jacó e a Mariana.
João Basto: O Dr. Jacó e a Mariana?
Agatha: Sim, ele e o sócio dele fizeram tudo, mas agora acho que não devemos mais tocar neste assunto, pois o atestado de óbito não vale e o dinheiro que pertence a vocês, já está em suas mãos.
João Basto: Sim, Vó Sebastiana, por favor nos perdoe, somos jovens ainda.
Agatha: Mas um dia vocês serão velhos e vocês não gostarão de serem tratados como tratavam Agatha. Ela tinha muita vontade de ensinar muita coisa para vocês, como várias vezes que vocês estavam com problemas parecendo sem soluções, ela podia ajudá-los, mas vocês jamais a deixaram dizer o que pensava, nem pediam a sua opinião. A minha pobre irmã, coitada, poderia ter ensinado a vocês como viverem em paz e serem felizes, pois acredite João, ela foi muito feliz. Com esse dinheiro entregue em suas mãos para os outros três e com mais uma fazenda doada para vários asilos, cumpro a meu dever. Vocês deixam de mendigar pelas ruas e os asilos que ajudei não vão conseguir pagar aos velhinhos internos a falta de amor das famílias que eles têm. Ignorância é isso que os jovens tem em abundância, é como diria minha velha mãe “os idosos construíram um mundo para vocês e quando vocês amadurecem se esquecem disso” e os marginalizam, como se fosse crime ser velho nesse país, internam-nos em asilos e os condenam a morrer sozinhos. Isso é um crime dos mais hediondos (chora e Eduardo tira um lenço do bolso e seca-lhes as lágrimas)
João Basto: Acho que a senhora tem razão.
Agatha (levanta-se e vai deixando o palco acompanhada de Eduardo)
João (fica olhando Agatha sair do palco, mas não consegue falar nada),
A cortina desce.

Cena 2: Ora! Viva! Meu Senhor!

Na mesa estão todos sentados muito bem vestidos. Som de campainha e Fafa vestindo um vestido de luxo entra no palco vai até a porta abre-a e faz gesto de cavalheiro como tirando a dama para dançar e Jacó entra).
Jacó (entra e vai até a mesa onde estão todos): Acho que demorei...
Fafa o acompanha até a mesa e fica em pé.
João Basto: Nenhum pouco Jacó. Sente-se (puxa uma cadeira e Jacó senta ao lado dele.)
Rui: Então como é? Vamos ou não vamos receber mais dinheiro de Vó Sebastiana.
Jacó: Vocês não. Mas Fafa tem 2 milhões e Mariana 4 milhões.
Adéia (olhando para as duas): Fafa e Mariana por que?
Jacó: Segundo Dona Sebastiana, Mariana a conheceu como tia Agatha e por ter sido tão bondosa ela merece receber mais do que todos.
João Basto: Mas e Fafa?
Jacó: Fafa, segundo ela, logo lhe dará um bisneto .
Adéia: João!
João Basto (desconversando): Não, vê la, só se for de outro.
Cesarina: Sei...
Fafa: O que é isso gente, eu não estou...
Jacó: Hoje vim de um dos asilos que ela está ajudando, precisam de ver quantos velhinhos vivem lá.
Rui: E ainda bem que Vó Sebastiana está vivendo com o seu marido.
Adéia (abanando-se): E que marido, (para Cesarina) cá entre nós.
Cesarina: Eu que o diga minha irmã.
Jacó: Então a partir de agora vocês podem fazer da vida de vocês o que quiserem.
João Basto: Eu vou aplicar o meu dinheiro em construção civil e você Rui?
Rui: Eu ainda não sei, só sei que a Prefeitura de Caracol vou deixar para os caramujos daquela cidade, vamos viver aqui na capital, (para Cesarina) não é meu bem?
Cesarina: Claro, meu anjo.
Jacó: João também já dei andamento no seu divórcio e acho que Adéia poderá refazer a sua vida.
Adéia: Graças a Deus, vou poder recomeçar minha vida, e rica, o que é melhor.
João Basto: É todos nós podemos ser felizes (para Fafa) - Não é minha pérola?
Fafa: É sim, meu senhor!
Cesarina: Que tal irmos até um asilo para fazer um gesto de boa ação. Ouvi dizer que Vó Sebastiana e seu gato vão todos os dias para um asilo e passam horas com os velhinhos. Quem sabe nós podemos encontrá-la em algum.
Jacó: A ideia é boa, mas dona Sebastiana está em sua segunda lua-de-mel, fazendo um cruzeiro que está dando a volta ao mundo.
Mariana: Que romântico, ela merece.
Bento Flores: É realmente ela rejuvenesceu. É o amor...
Fafa (chama João do lado, este levanta-se, ambos vão para o centro do palco). A luz fica no meio do palco e apaga a da mesa): Meu senhor, vamos morar aqui?
João Basto: Não minha pérola, nós merecemos uma mansão. Nossos filhos também.
Fafa: Ora!
João Basto (abraçando-a e ambos olhando para o público): Vamos ter uma bela piscina, uma grande jardim, várias empregadas e você será a patroa.
Fafa: Viva!
João Basto: E só nos amaremos pelo resto da vida (virando-se um para o outro)
Fafa: Meu senhor. (Fafa e João abraçam-se e ele lhe dá um beijo na testa)
Fafa: ORA! VIVA! MEU SENHOR!
(Apagam-se as luzes, fecham-se as cortinas)
Fim

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